Wednesday, October 29, 2008

Repete-se ad nauseam.
Os alunos bocejam, evitam fechar os olhos. Evitam, em vão. Alguns chegam mesmo a adormecer.
Acordam com o som do corpo do docente a cair, fulminado por um avc.
Muitos não conseguem evitar um sorriso suspirante.
Há três dias que tem dificuldades em adormecer.
A Euribor a subir, juntamente com a barriga da esposa, o trabalho de cresce na mesa de trabalho e na caixa de correio electrónico, o curso de especialização que o obrigaram a tirar.
Há três dias que tem dificuldades em adormecer.
Ele que não ressona, atordoou a turma com um ressonar pesado e descansado.
O professor, boquiaberto, acordou-o violentamente.
Há três dias que tem dificuldades em adormecer. Hoje não será diferente.
Chegou morto ao hospital.
O carro capotara, as pernas esmagadas, o corpo lacerado e partido.
Tentou despedir-se da esposa. Pairou até à sua rua, encontrou-a na cama com o vizinho do lado.
Ficou lívido!

A Mão


A caneta escorrega entre os dedos. Tenta mexer a mão, com sucesso. Agarra novamente a caneta.
Esta escorrega-lhe novamente entre os dedos.
A dormência desaparece rapidamente.
Encontra-se entre o temor e a curiosidade.
Agarra a garrafa de água com a mão. A dormência não volta. Com a esquerda desatarracha a tampa e bebe um trago.
Olha para a mão, belisca-a e sente o ardor.
Olha para a caneta e agarra-a com a mão esquerda. Faz uns rabiscos. Nada acontece.
Agarra novamente a caneta com a mão direita. "Automaticamente" a mão adormece.
Olha para a caneta, atira-a para o caixote do lixo. Senta-se ao computador e escreve o texto pretendido.
Hesito. A ponta da caneta vai sujando o papel, sem que uma letra ou palavra se distinga.
Tento que seja a caneta a escolher o caminho, que seja ela a pensar.
No entanto, os pontos, rabiscos e traços não ganham personalidade linguística.
Começo a passear mentalmente pelo alfabeto. Com que palavra começarei o texto?
E começarei com um verbo, um artigo ou um adjectivo?
Para quê perder tempo com o tamanho do texto se ainda não lhe descobri o tema? Ou que tipo de texto será?
Deixo a caneta a olhar para o papel, de cima para baixo.